A longa e velha escada de madeira rangia a cada passo dado. A outra margem parecia tão distante que chegar lá com vida parecia uma missão impossível.
De qualquer forma, ficar ali parado não era solução. Avançava a medo medindo bem onde pisava; de vez em quando olhava para baixo, sabia que não devia. As águas revoltas pareciam chamá-lo pelo nome. A queda era morte certa. Daquela altura ninguém sobrevive. Segurou-se bem e deu mais dois passos. Uma rajada de vento atingiu-o em cheio e fez a ponte abanar como se fosse o baloiço de um trapezista. Agachou-se bem agarrado. Suava por cada poro. Sentia as calças coladas ao corpo a tolherem-lhe ainda mais os movimentos. Reergueu-se muito devagar, expirou fundo, encheu o peito de ar e avançou mais um pouco. Evitou uma falha de tábua e tentou focar-se na margem à sua frente. Dizia para si próprio que iria conseguir. Percebeu que o saco que trazia a tiracolo era demasiado pesado e que devia ter seguido o seu instinto de levar antes a mochila. As botas, que teve em dúvida, também haviam ficado no quarto. Que ideia estúpida partir naquela aventura e ouvir o conselho do colega para levar os ténis. Respirou fundo de novo, afastou os fantasmas e avançou. Já ia a mais de meio quando o voo rasante de um gavião lhe tirou o chapéu. Ficou a vê-lo balançar em direção ao chamamento da água. O suor que escorria pela testa inundou-lhe os olhos de sal. Custava-lhe ver. Limpou-os com a manga da camisa e avançou. Pensou: “quanto mais depressa melhor”. Desta vez, dava passos mais confiantes e certeiros olhando sempre em frente.
Muitas vezes passamos por dificuldades e apertos na vida. Umas vezes, porque nos colocamos nessas situações; outras são as circunstâncias que nos levam lá; noutras, damos ouvidos a terceiros e deixamos que estes nos influenciem; ou ainda, porque não escutamos o nosso próprio instinto.
Que alcancemos sempre a outra margem, aquela onde moram os sonhos, apesar de todos os contratempos que possam surgir. Ficar parado no meio da ponte é que não.
